terça-feira, 23 de novembro de 2010

Memórias de um Espectáculo: O Dia que Chico Inventou a Música

Retirado daqui.

Memórias de um espectáculo
Policarpo Mapengo

Prometeu uma viagem aos temas que contaram a história deste país e fez uma digressão pelo seu próprio percurso musical como quem prova que “não só de memórias vive o Chico”.


Tinha prometido uma visita a sua memória. Assim recriou-se em pensamentos um espectáculo que faria uma viagem pelos tempos de bacela como “Merkandonga” onde todos reclamavam – o cliente e o vendedor: “dizem que estamos a lhes burlar mas não sabem que também compramos a preço elevado”- justifica-se uma das vendedoras na música que já nesse “antigo tempo” mostrava a importância das influências. “Unga mu dzivale Ibrahimo” ou “não te esqueças de Ibrahimo, é um velho cliente, passe-lhe o camarão por trás para que os outros não se apercebam”.


Essa música saltava da platéia entre os intervalos dos outros temas que Chico António ia interpretando. Era como se lembrasse a estrela que havia uma música escondida na sua memória, tal como o “hantlisa maria” – depressa Maria, arrume as suas coisas que tem um carro que vai a Gaza.”


A província de Gaza era vista como ponto de partida para o desenvolvimento. Podia também simbolizar o campo de onde se podiam – também nessa altura – ver como o pólo de desenvolvimento. Era desta província onde residia o sonho de alimentar o país com o arroz de Chòkwé.


As performances de Chico António têm, para o artista, o dilema de se criar “espectáculos paralelos”. É como se o público respeitasse as escolhas do artista mas que exigisse também que este corresse pela sua vontade. Mas é com a classe e segurança, aliada a nomes como Carlitos Gove, Paito Tcheco, Rufus e Simão. Juntou vozes femininas e levou um violino para sublinhar as músicas.


Quando, na semana passada se fez ao Franco Moçambicano para um “back to the time” foi buscar temas marcantes como “Baila Maria”. Na Orquestra RM, Chico António fez com Mingas uma das mais brilhantes duplas deste “País da Marrabenta” como diriam os Gpro. A ideia, contou Chico António ao “País Fim de Semana”, quando compôs a música era cantar sozinho e em português, mas convencido pelos seus “bosses” juntou a brilhante voz de Mingas e mudou para “tsonga”. Nasceu assim um dos clássicos deste “alquimista” da música que faria Manu Dibango retirar-se do seu sossego e o dar Prémio Rádio França Internacional. “Depois disso senti que já não era mais o mesmo,” disse nessa entrevista.


Tinha razão, “já não era mais o mesmo”. Nos seus espectáculos, o de Franco não foi diferente, encontra-se esse Chico António que faz experiências e aceita todas as influências. – “Escuto todo o tipo de música, até rock metal”. Mas esqueceu-se de dizer que a sua música carrega toda essa dose como nos levando pelos becos sul-africanos na lembrança, mesmo que a distância, de Sipho Mabuzi ou então numa quase doce e lenta morte de reggae que podia se confundir com uma voz emprestada de Alpha Blond.


Depois se posiciona como um “soba” e dita o ritmo que o público tem de dançar. Serve com uma tendência blues as cadências de uma noite, nesse raro jeito de arrancar aplausos com “Comer Camarão”.


Mas nessa relação com o público, Chico sabe que há coisas que não se podem fugir. Os grandes artistas sabem, disso, mesmo quando desligam os equipamentos e simulam um “asta la vista”. Sabem que não é isso que faz com o que o público abandone a platéia como também sabe que este pode ficar na sala e exigir – no caso de Chico António – que se cante “hantlisa Maria” e demonstrar essa vontade de ir a Gaza “pegar na enxada, plantar mandioca e criar gado.”

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Para quê Escrever Depois de Ualalapi?

Um livro que não se pode ler duas vezes
não merece ser lido uma vez.
(Já não me lembro onde li isto)

Para os meus velhos companheiros
na garagem, primeiro, e na varanda da AEMO,
nas noites que discutíamos literatura.
Fui ver Ungulani

Já não é boémio dos tempos que se seguiram quando, nos anos de 1990, o seu nome se confundia com Ualalapi. Nessa altura, entrávamos pela garagem da AEMO e juntávamo-nos para discutir sobre artes na Aro Juvenil e olhávamos para nós e víamo-nos grandes escritores que poderiam repetir a revolução da geração Charua, que invadiu a casa grande e se tornou em senhores das artes.
É dessa geração o Ungulani para quem eu olhava à distância enquanto trocava frases com Eduardo White, em mais um dos tantos lançamentos de livro.

Entre fumos de cigarros, quais mais velhos, gritavam de palco onde Sangare Okapi lutava para não ser mais Cardoso Lindo só para não ser, simplesmente, o filho do dramaturgo Lindo Lhongo. Ele queria seguir o seu caminho de poeta sem o fantasma do pai.

Nessa altura, atirava-se ao palco para declamar os seus poemas eróticos, enquanto Augusto Tembe esboçava uma dramática crónica, e Roberto Isaías ainda cantava “eu não chamei tchumba, chamei namorada”, nos Satélites.
Eu, Frederico Jamisse e Sangare Okapi, como nos tempos em que fazíamos teatro no Tintlari ta Hosi, desafiávamos as distâncias da Lhanguene para juntarmo-nos à malta entre todas as paixões que acompanhavam. Jamisse escrevia poemas de meter medo, onde repetia a ideia de sangue, sexo e violência e assinava como Freddy Cooper.
Milton Machel deixava-se levar em textos da Oasis e, mais tarde, declarar-se-ia – ou sempre foi assim - um rapper nas páginas culturais do Campeão onde, depois de correr desportivamente nas ruas de Alto Maé, atravessava a 24 de Julho para escrever poéticos textos de básquete.

Foi nessa altura que queria entrevistar Ungulani Ba Ka Khosa. Guardava ainda a troca de frases que fez com White em que um defendia “leiam para depois escreverem” e outro dizia “escrevam”. Nós queríamos escrever. Éramos putos que se assumiam escritores como o faria Ligeiro em “vendo poemas”.
Mas também era dominado pela paixão. Lembras-te Milton? Já falei sobre essa relação paixão e amor no que diz respeito ao jornalismo. Era altura em que éramos os putos do Campeão, quando importava mais correr e deixarmo-nos deliciar com os textos todos eles poetizados. Penso que fui vítima de Homero Lobo, esse meu mestre que, quando cheguei ao jornal pela primeira vez, olhou para mim e disse: - Escreva!
Não sabia o que iria escrever, mas tinha de escrever.
Ualalapi, de Ungulani, ecoava na minha cabeça quando liguei para ele a querer entrevistá-lo. Penso que na altura não sabia o que lhe iria perguntar. Acho que repetiria as perguntas dos testes da disciplina de português que faziam a pergunta que mais detestava.

“O que o autor quis dizer?” –irritava-me essa pergunta. Como saber o que o autor quis dizer?

Para Ungulani, não fazia sentido que um principiante o quisesse entrevistar. “Para vir perguntar meu nome e minha idade.” Justificou-se no encontro que teve com Homero.

Não sei se o perguntaria isso. Mas penso que falaríamos de Ualalapi. Ou perguntar-lhe-ia por que é que alguém que escreveu Ualalapi ainda precisa de publicar mais um livro. Porquê não se exilou nesse clássico que é um dos cem maiores livros africanos do século passado, como fez Luís Bernardo Honwana depois de “Nós Matamos o Cão Tinhoso”?

Porquê escrever depois de Ualalapi?

Essa pergunta perseguiu-me há dias quando combinámos a entrevista adiada há 12 anos. Não era mais o boémio dos tempos, mas mantém a sua coerência quando o assunto é política, como também não esconde o seu desamor quando fala de Samora Machel. “Era um ditador!”

Mas porquê escrever depois de Ualalapi? Perguntei, quando se posicionava para a fotografia. Não deixou de rir enquanto eu acrescentava. “Se fosse eu, depois de Ualalapi, não escreveria mais.”

Ele tem outra opinião. Nós é que andamos presos à fantasma de Ualalapi, mas ele já se libertou, razão pela qual consegue escrever outros livros como o seu mais recente “Choriro”.

Esta é uma carta que escreveria também para esse grande senhor da literatura africana, que soube desconstruir a história do império de Gaza para nos oferecer um livro sem preconceitos, onde os exageros o dão toda a grandeza.
Para Júlio Mutisse, esse meu irmão de todas as batalhas, “Orgia dos Loucos” é o melhor não só pela profecia que faz ao nascimento da Rosita numa árvore no tempo das cheias, mas tambem pela forma clara como olha para uma sociedade como um mundo de loucos.

Pode ser. Mas Ualalapi é Ualalapi.

Aquele abraço.

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Jornalismo, Bachir e a Causa Nacional

“A sociedade que aceita
qualquer jornalismo
não merece jornalismo melhor."
Alberto Dines
Querida Zenailda Machado
Matola 12 de junho de 2010
Nunca percebi melhor o que queria dizer um jornalista e escritor brasileiro quando revoltado com a sua profissão e arte disse com raiva: “chega de escrita, vou plantar batas e criar porcos!”
Era a descarga de quem engolira tantos sapos e se desiludira com aquelas que para muitos – até para mim – é a apaixonante profissão. Mas ontem Z, me apercebi que o caso Bachir põe em causa a nossa capacidade de pensar friamente.

Não sei se dessa distância que te encontras da nossa índica pátria amada te apercebeste das trincheiras que se formaram. Os jornalistas se demitiram do seu papel e se posicionaram claramente como “advogados” – de defesa e da acusação.

Os discursos jornalísticos que foram repetidos nos jornais e TV’s moçambicanos quando a notícia de “Bachir barão de droga” explodiu como uma bomba, tinham um subtil tom de “ainda bem”. Era como se todos estivessem a espera desse momento. Os jornais não se deram tempo para julgar (o que não é tarefa deles) correram logo para o condenar (o que também não é tarefa deles). Na imprensa – e porque Barack Obama disse – ele era sem dúvidas “o barão de droga”da África Austral.

Z, ontem precisavas estar neste país do Índico. O assunto de Bachir era o assunto nacional. O país quase que parou para se acompanhar vídeo conferencias na Embaixada dos EUA. Os grandes senhores, os barões do nosso jornalismos, homens com opinião respeitada e que o público pára para os ouvir se encarregaram de estar nessa conferencia. Não era espaço para os “putos” pois o “droguismo”de Bachir é um caso nacional. Foram “hi u kulo” – como diria minha avo.

O mais chocante é a desilusão (ou alívio) com que muitos ficaram por aquilo que chamam de “falta de provas”. O discurso jornalístico mudou e como que a heroificação de Bachir os canos das escritas viraram-se contra os americanos “como é que Obama acusa sem provas?”

Os jornalistas seniores estavam revoltados por se ter sujado o nome de Bachir sem prova. Entrincheiraram-se e atacaram sem piedade “o que estes americanos pensam que somos?”

Até posso perceber a indignação Z, mas este caso me trouxe uma coisa assustadora. O nosso jornalismo é feito de reproduções de discursos. “Bachir é barão de droga!” todos correram e fizeram manchetes. As TV’s dedicaram 15 a 30 minutos ao tema, com reportagens feitas com “diz-se que”, “segundo o especialista...” O tempo e as páginas foram assim preenchidos para a satisfação de todos.

Depois veio “EUA não tem provas” para o bem do país.

Não se fez uma corrida em contra mão que eu acho que deve ser o jornalismo. Mais do que aparecerem darem suas caras de estrelas do nosso jornalismo e dizerem “EUA não tem provas” era importante ajudar a compreender este caso de uma maneira fria que se exige ao jornalismo e jornalista.

Acho que não é papel de jornalismo/jornalista defender ou acusar. A obrigação é informar, é colher dados e ajudar a compreender os fenómenos. É preciso questionar porquê EUA meteu Bachir nessa lista e porquê aparece agora a não fornecer dados concretos. E isto não se olha simplesmente em linha jurídica como muitos querem nos fazer compreender. Penso eu Z que este caso deve ser visto na esfera jurídica, diplomática e económica.

Mas este é o jornalismo que temos. Um jornalismo de emoções e jornalistas advogados.

Sem mais linda, receba um abraço cá do indico, com o calor próprio da minha Matola para te ajudar a aquecer nesse reino que se quer unido.
PC

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Última Entrevista: Respostas Imaginárias

Uma coisa boa sobre a música

é que quando ela bate

você não sente dor.

Bob Marley

Para Tony Django

Eu sei que nunca se vai parar a música,

mas acredite que ela não será mais a mesma.


Mano, esta é uma carta de memórias. Também é o que se pode fazer quando se dedica a uma estrela que temos de aprender a ver o seu brilho através do coração porque sabemos que ela “não brilhará mais aqui.”

Acho que nunca te disse, mas sempre me recordaste Peter Pan. Me prendia sempre a assistir esse personagem que o seu maior, senão único, medo era ser adulto. Queria prender se na eterna infantilidade e se deliciar com as histórias da Wendy porque “acreditava em fadas”.

Será que acreditavas em fadas Tony? Me esqueci de te perguntar isso na única entrevista que me concedeste. Foi só uma entrevista não por tua culpa, mas porque sempre tenho dificuldades de entrevistar os meus amigos. Fica-me sempre aquela sensação de que de todas as perguntas que vou fazer, tenho as respostas.

Agora sei que é presunção. Sei que muitas perguntas ficaram por te fazer. “Acreditavas em fadas?”

Nunca te perguntei isso, como também não te perguntei se serias capaz de fazer outra coisa senão cantar? Se podias ser uma outra pessoa que não Tony Django? Agora sei que não te conhecia.

Olhava para ti e me recordavas Peter Pan.

Sempre me fascinei com a sua fragilidade infantil de um personagem que amava como adulto e estava preparado para lutar e demonstrar seu poder perante capitão Gancho.

Tinhas esses traços frágeis de adolescentes e te soltavas em sonhos na poderosa música de adultos. “Uta Bala ka Mani” é onde aparece a tua potência como se o seu corpo franzino ganhasse massa e exigisse que olhassem para ti como adulto.

Katchume era o exemplo de música que se podia fazer nessa altura. Rompiam com os estrangeirismos que dominavam a juventude e corriam para as raízes sem deixarem de introduzir conceito world típico das grandes bandas africanas.

Depois do sucesso do Ghorwane, precisavamos de uma renovassão que nos ajudasse a compreender o verdadeiro valor dos bons rapazes. E Kapa Dêch deu uma resposta a altura e nós percebemos o quanto este país estava a precisar de equilíbrio em termos de música.

Se lesses esta carta mano, sei que saberias que não estou a fazer nenhuma comparação pois são dois grupos completamente diferentes. Não falo apenas nas suas estruturas como também em estilo de música. Estou simplesmente a dizer que vieram mostrar que há muitos caminhos pelos quais se seguir.

Penso que isso é o que falta nestes dias.

Me esforço agora que te escrevo, a ouvir Dorropa. Me esforço porque é arrepiante lembrar que cada música em que aparece a tua voz é exactamente a última música em que emprestas o teu encanto de “fadas”.

Dorropa me fascina. É como se, pela tua voz me oferecesse a imagem de uma cidade que está a ser vendida aos bocados e se enche de sugidade. É retrato de um país degradado.

Olha mano, também não te perguntei sobre este país. O que achavas deste país? Acho que – estou a ser novamente presunçoso – dirias “haaa deixa lá disso vamos lá ali....”

Então nos meteriamos pela rua da Resistência irias querer falar da música que era o que corria em ti. Insistirias em me contar, acho que pela oitava vez, o sonho de construireres uma casa primeiro andar onde embaixo funcionaria um estúdio ou um centro cultural.

“Querias viver com música em casa?”

Acho que diria – “obviamente, eu sou a música”.

Eu sei mano que a música não vai deixar de existir. Iremos a Malhangalene beber um copo. Vamos cantar no Gil Vicente e dançar no África.. A música vai continuar, mas não será a mesma coisa.

Não haverá Dorropa com tua voz, não vamos ouvir “Mamane” e o seu apelo a iguladade “hi tlanlane magoda hita ringanana – penso que é assim que se escreve – tirem-nos as amarras para estarmos ao mesmo nível - não se fará mais tributo sem teu nome, não haverá mais Tony Django na última correografia do espectáculo do K-10!

NI TA BALA KA MANI!Mano, esta é uma carta de memórias. Também é o que se pode fazer quando se dedica a uma estrela que temos de aprender a ver o seu brilho através do coração porque sabemos que ela “não brilhará mais aqui.”

Acho que nunca te disse, mas sempre me recordaste Peter Pan. Me prendia sempre a assistir esse personagem que o seu maior, senão único, medo era ser adulto. Queria prender se na eterna infantilidade e se deliciar com as histórias da Wendy porque “acreditava em fadas”.

Será que acreditavas em fadas Tony? Me esqueci de te perguntar isso na única entrevista que me concedeste. Foi só uma entrevista não por tua culpa, mas porque sempre tenho dificuldades de entrevistar os meus amigos. Fica-me sempre aquela sensação de que de todas as perguntas que vou fazer, tenho as respostas.

Agora sei que é presunção. Sei que muitas perguntas ficaram por te fazer. “Acreditavas em fadas?”

Nunca te perguntei isso, como também não te perguntei se serias capaz de fazer outra coisa senão cantar? Se podias ser uma outra pessoa que não Tony Django? Agora sei que não te conhecia.

Olhava para ti e me recordavas Peter Pan.

Sempre me fascinei com a sua fragilidade infantil de um personagem que amava como adulto e estava preparado para lutar e demonstrar seu poder perante capitão Gancho.

Tinhas esses traços frágeis de adolescentes e te soltavas em sonhos na poderosa música de adultos. “Uta Bala ka Mani” é onde aparece a tua potência como se o seu corpo franzino ganhasse massa e exigisse que olhassem para ti como adulto.

Katchume era o exemplo de música que se podia fazer nessa altura. Rompiam com os estrangeirismos que dominavam a juventude e corriam para as raízes sem deixarem de introduzir conceito world típico das grandes bandas africanas.

Depois do sucesso do Ghorwane, precisavamos de uma renovassão que nos ajudasse a compreender o verdadeiro valor dos bons rapazes. E Kapa Dêch deu uma resposta a altura e nós percebemos o quanto este país estava a precisar de equilíbrio em termos de música.

Se lesses esta carta mano, sei que saberias que não estou a fazer nenhuma comparação pois são dois grupos completamente diferentes. Não falo apenas nas suas estruturas como também em estilo de música. Estou simplesmente a dizer que vieram mostrar que há muitos caminhos pelos quais se seguir.

Penso que isso é o que falta nestes dias.

Me esforço agora que te escrevo, a ouvir Dorropa. Me esforço porque é arrepiante lembrar que cada música em que aparece a tua voz é exactamente a última música em que emprestas o teu encanto de “fadas”.

Dorropa me fascina. É como se, pela tua voz me oferecesse a imagem de uma cidade que está a ser vendida aos bocados e se enche de sugidade. É retrato de um país degradado.

Olha mano, também não te perguntei sobre este país. O que achavas deste país? Acho que – estou a ser novamente presunçoso – dirias “haaa deixa lá disso vamos lá ali....”

Então nos meteriamos pela rua da Resistência irias querer falar da música que era o que corria em ti. Insistirias em me contar, acho que pela oitava vez, o sonho de construireres uma casa primeiro andar onde embaixo funcionaria um estúdio ou um centro cultural.

“Querias viver com música em casa?”

Acho que diria – “obviamente, eu sou a música”.

Eu sei mano que a música não vai deixar de existir. Iremos a Malhangalene beber um copo. Vamos cantar no Gil Vicente e dançar no África.. A música vai continuar, mas não será a mesma coisa.

Não haverá Dorropa com tua voz, não vamos ouvir “Mamane” e o seu apelo a iguladade “hi tlanlane magoda hita ringanana – penso que é assim que se escreve – tirem-nos as amarras para estarmos ao mesmo nível - não se fará mais tributo sem teu nome, não haverá mais Tony Django na última correografia do espectáculo do K-10!

NI TA BALA KA MANI!

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Dos Bifes A Ditadura Da Media

"Se você não tem motivos para sorrir,

pelo menos não dê motivos

para os outros chorarem."

Anónimo


Matola, 14 de Abril

Uma canção para Seth Swaze

Pelo seu aniversário e

pelas músicas que nunca gravou

Mano, uma vez descansava o triste peso de um dia em que corremos atras do que não sabemos só para nos iludirmos que fazemos alguma coisa. De remoto na mão fui repetindo essa inaptidão a procura, nas nossas TV’s, de qualquer coisa que pudesse assistir. Sabes Seth, há horas que nos apetece partir o televisor por não nos estar a servir para nada. Mas esse dia fui me prender na 21ª hora, e Fernando Lima sugeria para ler “A Ditadura da Media”.

Me admira o poder disciplinador da media do mesmo jeito que me assusta a forma de interferir nas nossas vidas. Uma espécie de invasores impiedosos que se dão ao luxo de determinarem o que temos de fazer, onde devemos comprar e o quê comprar. Pior, a quem amar!

A media venceu. A Televisão tomou de assalto o papel previligiado dos pais e passou a ser o educador destes e dos seus filhos. Já te apercebeste do silencio que os pai impõe ao filho na hora do telejornal e aquele que a mãe sujeita quando passa uma telenovela?

Te dizia mano que a media venceu e determina onde comprar as coisas. Rui Michel foi a última vítima dos bifes por ter feito compras no Xipamanine. Va ka hina, por se ser músico não se pode fazer compras no Xipamanine?

O que mais intriga é concentração das pessoas para ver “daqui a pouco”essa grande matéria. E ainda me vem dizer que o tempo de antena na TV é caro. Façam-me rir.

Mas te queria falar de música mano.

Parti dos breves minutos da tua música ontem para recuar no tempo em que com Zé Manuel – onde anda esse companheiro? – fizeram uma parelha e percorreram um jazz todo gospelizado cheio de marrabenta que alertava “deixem os pintos crescerem”. Queria voltar para o poder da música que a media não encontra motivos para a expor nos seus canais (falo das TVs) porque o tempo da antena é caro.

Voltei aos spirituals que não eram exactamente das noites revolucionárias da capoeira ou do hip-hop das ruas novaiorquinas importados dos ritmos da jamaica.

Eram música de lamento e crença no poder divino para o descanso espiritual, pelo peso de tanto trabalho nas plantações de canas-de açucar. Será daí que evoluiu a tua música Seth?

Essa minha leitura pode ser influenciada pela tua ligação com a religião onde parece ser a base para a grande música. Podia correr para os coros que inspiraram os Boyz II Man, mas posso me prender – gosto desta – na Irinah ou mesmo na Lizha James dos tempos iniciais da sua carreira em que a voz era o seu principal instrumento de sedução. Lembras?

Alguns dos teus ídulos também não se escapam dessa influência religiosa, falo por exemplo de Arão Litsuri. A tua música me levou de volta a esse passado para compreender a evolução de algumas das nossas histórias.

Na sexta-feira fazes 34 anos e vais cantar para os teus amigos no Mbuva. Espero esse regresso, e acredito que na tua marrabenta, afrojazz e gospel teremos uma forma de fazer uma viagem pela world music, do nosso jeito.

E espero que depois trabalhes para produzires um disco e que ganhes mais indo ao palco que indo ao tribunal como advogado.

Hã... cuidado, se fores as compras ou se fores dar umas voltas pelas avenidas onde as mulheres estão dispostas a te amarem por uns minutos a troco de alguns valores podes ser o proximo bife.

Aquele abraço

PC


quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Uma Noite com Maria Teresa Dzukuta

A maior covardia de um homem

é despertar o amor de uma mulher

sem ter a intenção de amá-la.

Bob Marley

Matola, 17 de Fevereiro de 2010

Querida amada,

O 14 de Fevereiro me deprime!

Me pedes a verdade como se eu a te pudesse dizer.

Podia deixar as horas correrem, te falar do pânico que se reinstala sempre que os telejornais recuperam as notícias de polícias assassinados. Não importam as causas, diria a minha mãe com o rosto espantado e as mãos na cabeça como se a temer pela sua própria segurança: “se matam polícias o que será de nós?”

Mas não é isso que te preocupa.

O Estado pode ser assassinado isso não te diz nada. Me olhas como se fosse eu culpado pela morte de Michael Jackson e me acusas de ter assassinado o teu estado emocional. Me perguntas sem nenhuma compaixão pelo desgaste físico e financeiro que passei na noite de 14 de Fevereiro. A tua única preocupação é saber onde estava, com quem a fazer o quê e como!

Sinto egoísmo da sua parte. É como se eu fosse tua propriedade privada, teu homem de estimação que as outras não podem tocar nem por um segundo.

Me desgosta o teu interrogatório. Não porque não o podes fazer, mas porque não te posso responder.

Te digo que fui aos copos com os meus novos amigos de infância e nos perdemos no tempo falando daquilo que podia ter sido a nossa história se tivéssemos nascido e crescido no mesmo bairro.

Me olhas com o mesmo desprezo de uma serpente desesperada. “Onde estiveste?”

Não te posso dizer! Como dizer?

Uso a arma dos fracos para poder me defender dos teus ataques fulminantes. Grito e exponho minha força física para me acobardar, e te lembro que estou cansado!

Me perdi na noite deste 14 de Fevereiro num bar da esquina onde Maria Teresa Dzukuta ao ritmo de cada copo de cerveja, pisca o olho para quem paga mais como nos concursos das operadoras celulares, nos quais que ganha quem mais mensagens enviar.

Lá, como diria Manuel Bandeira, mesmo não sendo Pasárgada, há muitas prostitutas bonitas para namorar. Deixam-se aos montes e fazem a mesma promoção de tomate no mercado. Prometem bassela e noite inesquecível.

Olha meu amor. Consegues imaginar como ficam os lábios prostitutos de Maria Teresa quando te promete uma noite inesquecível?

Me perdi nessa sensualidade selvagem e as minhas mãos soltaram-se para deslizarem nos meus bolsos e tirarem as notas enquanto gritavam em voz alta para todos me ouvirem dizer para Paito, servente do bar, “fique com os trocos”!

Maria Teresa dzukutava para mim, mesmo quando aparecia por engano uma música de Aretha-Franklin. É como se a sua existência existisse apenas de cintura para baixo. E é por ai onde também me fixava.

É verdade amor, fugi dos jantares a dois a luz de vela numa mesa onde o som chega de fininho, como se estivéssemos nos tempos em que devíamos ter medo que alguém se apercebesse que ouvíamos músicas revolucionárias.

Dizes que é romântico?

Romântico?!

É tedioso meu amor!

Por isso que os 14 de Fevereiro me deprimem.

Lá na Maria Teresa falamos em voz alta e soltamos palavrões sem nenhuma preocupação em sermos educados. Dançamos sem nos preocuparmos em acertar o passo, bebemos sem nos preocuparmos com a quantidade, fazemos amor sem nos preocuparmos com preliminares.

Somos nós mesmos, percebes meu amor?

Mas como te dizer isso?!

Me deixe ver telejornal.

Dois polícias são assassinados. Clic!

Bairros da Matola estão há meses sem água. Clic!

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Esquecer Matola, ouvir T’Yana para Lembrar Samora e olhar Guebuza

Um homem que quer reger a orquestra

precisa dar as costas à plateia.

James Cook


Para Jorge Saiete, Lazaro Bamo

e o recém admitido ao

triste clube matolense

Júlio Mutisse


Desliguei-me da Matola que tanto amo.

Os jornais repetem as notícias do lixo e os residentes de Fomento saem a rua para reclamar a falta de limpeza “enquanto pagamos taxa de lixo”. O presidente do Município espreita para a capital e nos apazigua “se até Maputo tem lixo”. Clic!

Comemoravam-se 38 anos de Matola como cidade. Nessa noite as estrelas foram ofuscadas pelo fogo de artifício.

Viva Matola!

Esqueço Matola e seu lixo, sua falta de água, promessas não cumpridas de estradas e eternos seminários sobre plano de estrutura urbana!

Viva Matola!

Mas me esqueci da Matola, da revolta populacional e comentadores das TV’s que põem em causa a competência do seu presidente que sempre acreditou na “Matola Primeiro.” Clic!

Me esqueci!

Me tranquei no quarto e recuperei um disco de T’Yana exumado do baú das memórias para fazer um back ao passado de um povo que levantava o nariz e dizia aos governos racistas de Ian Smith e Pieter Botha que “somos pobres com orgulho”.

T’Yana nos leva de volta a um país que era liderado por um homem de causas, que preferiu trancar as suas fronteiras e punha o povo a cantar “Smith wa lhanya” algo como “Smith é louco”.

Eram os tempos que brincávamos djiplokotsos a Kapango na Escola Primária de T-3 e festejamos a distribuição de leite em pó nos intervalos depois de longas filas para vacinação. Nessa altura, na curiosidade de ver o Presidente nos juntamos nas machambas 16 de Junho pertencente a Cooperativa das Zonas Verdes para o ouvirmos gritar “Independência ou Morte, Venceremos!”

É neste contexto que aprece T’Yana inspirado no discurso de Samora Machel depois do comando boer, no dia 30 de Janeiro de 1981, ter invadido Moçambique para assassinar militantes do ANC.

O tom de desafio de Samora Machel e interpretação perfeita de Yana, é a demonstração de segurança de um país acabado de sair de uma luta pela independência frente a um exercito colonial violento, que não aceita dobrar-se perante uma potencia regional que era a África do Sul do Apartheid.

Que venham, estamos prontos para os receber com uma sandes de marreta, um copo de creolina, um rebuçado de pregos, um bolo de granada e para fazer digestão um coro de armas viradas para eles.

Esta é a forma como um país de terceiro mundo, considerado na altura, muito mais do que hoje, mais pobre do mundo.

Mais do que as consequências que o país passaria ou que passou, se olharmos para toda a sabotagem que o país viveu, o mais importante era passar para os nossos inimigos a mensagem de um país que não verga, um país que poeticamente se definiria “pobre mas orgulhoso”!

Hoje podemos encontrar o mesmo discurso em Armando Guebuza. É claro que já não se coloca o verso de “pobre orgulhoso” mas o de auto estima.

Os inimigos de hoje são outros, como o definiu Marcelino dos Santos num seminário organizado pela Coopal_ Jornalistas Culturais, onde Armando Guebuza era o principal orador, antes da sua eleição para o primeiro mandato.

Os inimigos são outros, dizia o libertador. Armando Guebuza olha para a pobreza absoluta que se pode vencer com trabalho e auto estima. Para Graça Machel, na abertura do ano lectivo d’A Politécnica, é importante que o moçambicano em qualquer parte do mundo se sinta moçambicano mas parte deste mundo.

Mas voltamos ao discurso combativo de Samora em Yana. Se Graça Machel hoje fala desse orgulho de ser moçambicano, podemos recuar para “Daqui Não Saio Daqui Ninguém Me Tira”.

Eu aqui nasci e é aqui que vou morrer.

Se alguém vier para me tirar eu não vou sai.

Nunca deixarei que alguém me roube esta terra.

Venha de onde vier, Independência ou Morte daqui não saio.

Mais uma vez encontra-se aqui no verso de T’Yana o tom desafiador samoriano. A ideia de terra que nos vê nascer e que suporta os nossos mortos. O discurso é típico do momento em que o país vivia e o Marechal precisava fazer acreditar ao seu povo que a defesa da pátria valia todo o nosso sangue. Foi assim que se ganhou a “liberdade” e é por amor a terra que hoje podemos nos entregar, diria Guebuza, no combate a corrupção e renovação de liberdades individuais se quisermos realmente combater a pobreza.

Podemos falar de unidade em as tuas dores mas as minhas dores vão estrangular a opressão. Penso que esta é das músicas mais significativas do professor Yana. A ideia da unidade para se atingir um bem comum. No entanto a unidade não pode significar todos nós estarmos a fazer a mesma coisa. É estarmos a contribuir a nossa maneira para um mesmo fim. Guebuza recupera essa ideia de unidade primeiro com indicação de 2009 como ano Eduardo Mondlane e depois no discurso da sua investidura onde fala de uma colaboração entre a geração 25 de Junho, a geração 8 de Março e a geração de Viragem.

Os teus olhos mais os meus olhos vão falando da revolta.

A tua cicatriz mais a minha cicatriz vão lembrando o chicote.

As minhas mãos mais as tuas mãos vão pegando em armas

A minha força mais a tua força vão vencer o imperialismo

O meu sangue mais o teu sangue vão regar a vitória.

É claro que não vencemos o imperialismo mas estamos a construir um país enquanto a nossa Matola assiste. Voltei a Matola porque acabou a música e dá para olhar que o seu presidente quer reger uma orquestra virado para o público. É por essa razão que está preocupado com os seminários para aparecer sempre em público através dos órgãos de informação.

Aquele abraço

PS: Não consigo fazer o upload da música aqui. Quem a quiser que me dê um toque por email.

PC

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Morte de Jeremias e Fim Da Crítica

Difícil não é lutar por aquilo que se quer, mas sim desistir daquilo que se mais ama. Eu desisti. Mas não pense que foi por não ter coragem de lutar, e sim por não ter mais condições de sofrer!

Bob Marley

A Rosa Langa

Por todas as inconfidências

e tudo que nos rimos e sonhamos.

Querida Rosa Langa,

O ano começou e ainda não tivemos tempo para falarmos sobre os teus grandes projectos. Espero que esta carta te encontre em tua melhor forma, como uma verdadeira 4X4.

Falando de projecto “nha” Rosa, na terça-feira com a corrida pela tomada de posse dos deputados provinciais fiquei preso a notícias de todos os cantos e me esqueci de te escrever. Por todas as razões tinha de ser para ti a minha primeira carta deste ano.

Sabes maninha, ando desesperado a procura de algo que me surpreende. Quando oiço o General Líder Mais Bonito e Jovem Dhlakama a falar, por causa daquela sua “determinação” herdada nos longos anos da luta, espero sempre para ver o que realmente irá acontecer. Tu me conheces “nha” Rosa e sabes que a violência não é minha praia. Mas acredite que eu gosto do discurso do general e me ponho sempre na expectativa para ver qual será o final da novela que ele escreveu.

Foi, acredite mana, num misto de alegria e pena que vi os deputados da Renamo todos elegantados nos seus fatos para tomarem posse. Era como se assumissem um ar de desafio a liderança do General. É como se o tigre tivesse perdido toda as suas garras e se valesse apenas da pele para amedrontar as crianças.

As “más línguas” (?) dizem também que os próprios deputados eleitos para a Assembleia da República vão desobedecer o líder, não por causa do seu compromisso com a pátria, em particular os seus eleitores, mas pelos 40 mil de meticais que os esperam naquela casa do povo. É coisa para se dizer isso mana?

Eu prefiro acreditar que o farão por um dever patriótico. Mas se tu, minha querida irmã, pudesses, ao teu jeito, fazias uma edição das Inconfidências de Dhlakama, quem sabe se ele não nos diria o que realmente vai na sua alma.

Querida Rosa, sei que estas coisas de política te deixam mal disposta.

Não é tua praia!

Por isso que vou parar apesar de não me faltar a vontade de te falar da entrevista de Daviz Simango ontem, principalmente quando faz um recuo a história da Frelimo até a morte do seu pai. É interessante ver como ele bebeu dos camaradas, me pareceu guardar tumularmente um segredo, uma espécie de pacto de sangue dizendo simplesmente que “alguém vai contar”.

Bom, maninha, sei que me dirias simplesmente que isso é com eles. Sei como foges dessas coisas. Precisas apenas de curtir uma boa música, pegar tua muchila e descobrir sítios onde há gente que acredita que Samora ainda é presidente de Moçambique, onde quem tem uma bicicleta para ir a Malawi comprar açúcar para vir vender em kwacha porque nunca pegaram metical.

Olha “nha” Rosa, pensei em te escrever esta carta na madrugada de dia 2 de Janeiro, na ressaca de “ano novo”. Sabes companheira, naquelas horas que nos achamos ricos, tiramos cadeiras e nos deixamos estar no meio de uma das ruas do meu T-3. Um dos meus amigos estacionou seu carro, abriu as portas e ligou, qual poderoso, num bom volume para que todos ouvíssemos a forte voz de Jeremias Ngwenha.

Mana, não te posso jurar que estava lúcido, não havia condições morais para minha lucidez naquela hora, mas eu podia ouvir de verdade Jeremias Ngwenha. Acordei estes dias todos lembrando os seus temas e os repetia mentalmente para que não me esquecesse do quanto não paramos para pensar nisso.

Penso que Amosse Macamo (como vai mano?), um especialista em música moçambicana ainda não se deu tempo para olhar para a morte de Jeremias como o fim da crítica na música. Sei que é exagerado chamar a isto de fim mana Rosa, e que o justo seria o silêncio.

Os rappers, mais pela origem do próprio estilo em que os Ganster Rap se evidencia como um ritmo de pretexto, onde a letra é mais importante que toda a componente da música, se esquiva desse papel.

O rap moçambicano me parece estar mais talhado ao que se considera “música de revista”, mais ao estilo dos jornais que vão relatando “o povo está com fome e saiu a rua”, e quando quer pegar pesado vira-se contra um dos seus companheiros.

Na segunda-feira fiquei a olhar para TVM passando uma série de música Rap e chamou-me atenção YoYo, primeiro pelo título da música “Mesmo Bandido”. Depois era a letra onde assume “sou gangster armado” e manda recados fortes a Danny OG.

Esta é uma faceta do Rap, mas acho que rhythm and poetry do nosso país pode ser muito mais explorado como já o fizeram bem os G-Pro em “País da Marabenta”.

Voltando a Jeremias Ngwenha, mana, o que gostava dele é a capacidade de fugir desse estilo de revista é nos oferecer coisas que vivemos nos nossos dias como se fosse uma descoberta sua. Te lembras de “vada voche”? – penso que é assim que se escreve. Ele abandona o estilo clássico de poesia que, curiosamente encontramos no Rap, falo de versos em rimas, e assume o lado “vadio” para nos alertar que há gente que se esquece que nós existimos.

Jeremias não era adorado pelos seus “olhos azuis”, mas por uma mistura de espectáculo, música e letras que cada um que subia “chapa la ni kakaulhula” sentia na pele o que é estar numa bicha que não anda.

Percebes o que estou a tentar dizer “nha” Rosa?

Estou a falar de letras não muito eruditas ao estilo de “povo no poder”, mas sim de uma “surpresa” que Jeremias apanha em “Kase Ka Maputso ku ta”? Algo como “afinal Maputo é assim?” e ele começa a descrever os dissabores e o fim de sonho que atinge todos que olham para Capital como a terra onde tudo acontece.

“Nha”Rosa, o ano ainda está a começar e sei que vamos ainda nos encontrarmos para um mousse de chocolate.

Até lá maninha, espero que a segunda edição do teu livro Moçambique, Mulheres e Vida volte a esgotar como a primeira.

Um beijo, sem nenhuma inconfidência.

PC