Socorro, alguma alma, mesmo que penada
Me empreste suas penas.
Já não sinto amor nem dor
Já não sinto nada.
Socorro, alguém me dê um coração.
Que esse já não bate nem apanha.
Por favor, uma emoção pequena,
Qualquer coisa que se sinta,
Tem tantos sentimentos, deve ter algum que sirva.
In CD “UM SOM” de Arnaldo Antunes
Ao marido da minha amante
Querido sócio, desta Matola onde construo meus sonhos, te escrevo para mostrar a minha indignação. O meu país está a atravessar um ímpar momento de campanha eleitoral. Falo de escolhas, sócio.
Eu não queria voltar ao assunto político neste meu canto a moda antiga. Sabes sócio que há uma onda de alianças dos excluídos com os candidatos não desqualificados e, logo, sérios (alguns hão de ser, de certeza)? É engraçado olhar para este cenário. E eu já me questionei sobre posições políticas dos nossos partidos.
Diga meu companheiro, podemos falar de esquerda direita ou partidos de centro no nosso cenário político? O que é que o PIMO ou os Ecologistas têm a ver com a FRELIMO? O que é que os que declararam apoio ao MDM têm a ver com este movimento? Fiz me, também, esta pergunta numa outra vertente como “o quê é que a União Democrática acrescentou a Renamo?”
Pelo menos sei que a Renamo deu a muitos dos líderes desses partidos oportunidade de se sentarem nos bancos do parlamento.
Mas não é contigo que me interessa discutir política.
Te escrevo para expressar a minha indignação pela forma como olhaste para o meu esforço cristão de ajudar o próximo, neste caso a tua linda mulher.
Chegaste companheiro, faiscando de ódio pelos versos mentirosos e maliciosos que ouviste pelos becos da tua vizinhança, e te atiraste sobre a minha fragilidade com a raiva de fera.
Não me deste oportunidade de me explicar. Era para ti o rosto hitleriano de uma guerra que ainda estava para começar. Estendi-me sobre o asfalto perante olhares sorridentes desses vizinhos que nunca compreenderam a minha relação altruísta para com a tua linda mulher.
Juro-te que só queria ajudar.
Sacrifiquei o tempo que devia, apaixonadamente, dedicar a minha mulher e as duas esbeltas namoradas, para poder tratar da tua mulher solitária e abandonada nas noites de Inverno que, durante dois anos a deixaste nos lençóis do teu quarto vazio.
Compreendes agora companheiro?
A minha missão foi cuidar do teu património enquanto te distanciavas por essas belas terras de rand onde se diz que a riqueza se tira debaixo do solo. É verdade? Nós cá corremos contra a pobreza e desejamos que o nosso solo deixe de servir simplesmente para enterrarmos os nossos mortos.
Bom, mas isso é uma outra história.
Olhe sócio. Mesmo depois de ter jurado nunca mais te voltar a dirigir a palavra, cedi a coação jeitosa da tua bela esposa para te pedir desculpa. Por mim, ficava neste silêncio sarcófago e, já que estás de volta a terra do rand, também abandonaria a tua mulher na solidão a que vivia antes, a ver se aprendias a agradecer os gestos generosos dos outros homens.
Mas como te disse antes, pela minha educação cristã, não gosto ver uma mulher a sofrer sem poder a ajudar. E isso companheiro, a tua paixão cega não permitiu observar.
Dizia meu sábio avô que uma casa tem que ter um homem por perto. Penso que tu nunca tiveste essa lição senão não abandonarias a tua bela dama em busca de uma fortuna nas terras dos outros.
Eu percebo essa necessidade de riqueza e queria que continuasses nessa busca com a certeza de que a tua casa está em boas mãos. Sempre esteve e tu não percebeste durante a semana que estiveste cá.
A tua fúria que se traduziu em socos violentos e repetidos insultos não te permitiram que te apercebesses do meu trabalho ao longo da tua ausência.
Soltaste verbos insultuosos e mesquinhos só para não agradeceres por ter ficado a matar cobra na tua casa. E nem te apercebeste que te ajudei a fazer um filho que não conseguias havia 6 anos depois do teu casamento.
Eu percebo a ingratidão.
Por tudo que partilhamos, aquele abraço.
PC Mapengo